quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Em memória de D. Mice

Há mais ou menos 10 anos eu conheci Dona Misse. Embora nossa covivencia nunca tenha sido diária, nunca me esquecerei de suas frases famosas: “Cuida da tua vida, diabo!”. “Tás ficando doido, diabo”!”. Embora católica, Dona Misse, que morreu na madrugada do ultimo dia 22 den dezembro sempre dava um jeito de incluir o diabo em suas frases de efeito. Isso é apenas uma das características da “velhinha” que farão com que eu jamais me esqueça dela. Eu sempre vou lembrar que Dona Misse gostava de dias ensolarados porque eram bons para lavar roupa. Sempre vou lembrar de seu jeito austero, cumprindo rigorosamente as tarefas do dia, sendo que depois de cumprir toda sua agenda de afazeres domésticos, a única concessão a qual se permitia era tomar duas latinhas de cerveja. Se tivesse nascido 30 anos depois, arrisco dizer que ela seria das minhas. Ou quase.
Dona Misse na verdade se chamava Misselaneia. Era mãe de M., que um dia foi o amor da minha vida. Sabe como você tem certeza que uma pessoa é um dos amores da sua vida? (Sim, meus queridos, porque eu não acredito que cada pessoa tenha UM amor da vida, que em cada fase da vida podemos ter um amor). É quando a relação romântica/sexual acaba e que nem por isso o sentimento deixa de existir. Muito pelo contrário.
Dona Misse era mãe de M., um dos maiores amores da minha vida. Não quero contar agora sobre a nossa relação, sobre as razoes de não termos ficado juntos. Não era pra ser. Mas a despeito disso faz-se necessário dizer que M. sempre estará no meu coração. Segundo as minhas crenças, o amor verdadeiro nunca acaba; ele se transforma. Então o que eu e M. vivemos durante quase 3 anos, durante o tempo em que fomos praticamente casados, é isso: um amor imortal, que não foi adiante por motivos variados, mas que continuou existindo sob a forma de uma bela amizade. Meu marido entendeu, a namorada de M. entendeu. Nós nos amamos um dia e não nos amamos mais. Mas esse amor nunca deixou de existir. Hoje ele vive sob a forma de uma grande amizade. Eu desejo do fundo do meu coração que ele seja feliz e sei que ele quer o mesmo para mim.
Dona Misse se foi aos 85 anos cansada de guerra. Segundo M., foi rápido, ela não sofreu. Teve mais sorte que meu pai, que se foi antes de completar 55 e que sofreu feito um cão. Ainda assim, sinto sua morte. Toda perda é triste, sobretudo pra quem não tem outra pessoa na vida, como M. Eu queria poder lhe dar mil palavras de conforto, mas sei que nessa hora tudo é inútil. De qualquer forma eu só espero que exista um céu, que ela, meu pai, meu gato Zaratustra estejam agora olhando pra gente condescendentes, pensando: “Tu não sabes de nada, diabo!”

domingo, 30 de outubro de 2011

O câncer, os reaças e a minha falta de fé na humanidade

Em julho de 2007 meu pai foi diagnosticado com câncer de laringe. Era pequeno, estava no começo e ele se tratou num dos melhores hospitais da América Latina. Noventa por cento de chance de cura, foi o que os médicos disseram. Mas ele morreu mesmo assim.

Durante quase três anos eu vi o meu pai ser comido por dentro. Eu o vi envelhecer uns 20, ficar seriamente deprimido, vomitar depois de beber água, ser mutilado com uma laringectomia radical, perder todo o cabelo do corpo na quimio, reaprender a falar, se alimentar via uma sonda estomacal. Câncer de laringe. Alguns meses de trégua e depois de uma cirurgia considerada muito bem sucedida, lá estava ele de novo, no esôfago. Quimio pesada, mais uns meses de trégua e o maldito voltou. Mais quimio, radio, meu pai que sempre havia sido um homem forte e orgulhoso ia se tornando um farrapo humano, até que um dia ele explodiu e sangrou até morrer. Eu estava lá, segurando sua mão até ele respirar pela última vez, até o seu coração parar de bater. Mas o pior de tudo isso é saber que morrer foi o melhor que poderia ter lhe acontecido naquela altura, porque quando se trata de câncer terminal as coisas sempre podem piorar, porque deveria haver um limite do quanto um ser humano pode sofrer. Mas não há.

Ontem todos os meios de comunicação deram que o ex-presidente Lula tem a mesma doença que matou meu pai. Eu não sei se dá pra imaginar a dor que é pra quem já perdeu alguém que amava pra esse mau ler "câncer de laringe" em todos os jornais. Eu sempre me comovo com a notícias sobre câncer. Creio que todo mundo que já passou pelo sofrimento de perder alguem amado pra essa doença deve sentir algo parecido. Toda vez que José Alencar dava um "Olé!" na morte, era como se o meu pai estivesse vencendo junto. Por isso quando ele se foi eu senti como se nós tivéssemos perdido a guerra juntos.

Mas não era sobre isso que eu queria falar. O que realmente me perturbou a respeito da notícia da doença do Lula foram os fatos de: a)Muitas pessoas estarem comemorando e fazendo piada com a doença do ex-presidente b)A campanha para que ele se trate no SUS. Como bem pontuou um amigo, se Lula se tratasse pelo SUS, diriam que ele está tirando a vaga de quem realmente precisa, já que tem condições de pagar por um tratamento privado. O meu pai era funcionário público. Mas optou por um tratamento privado não apenas pela qualidade do serviço. Ele não queria ocupar a vaga de alguém que não tivesse condições de pagar. Meu pai sempre pensou nas outras pessoas e não deixou de ser assim nem na hora mais difícil de sua vida.

Eu gostaria de perguntar a essas mesmas pessoas, que quando adoecem certamente não se tratam pelo SUS, se elas tivessem câncer e tivessem condições de ter acesso ao melhor tratamento, se não fariam de tudo para ter uma chance. Foi o que o meu pai fez. Nos primeiros seis meses de tratamento do meu pai, nesse mesmo hospital onde o presidente fará a quimio, minha mãe trabalhou dobrado num segundo emprego para que eles tivessem dinheiro para pagar pela radioterapia, já que as economias deles da vida inteira não seriam o suficiente. E quando o dinheiro acabou os companheiros de trabalho do Tribunal de Contas do Amapá, onde meu pai era funcionário, se mobilizaram para conseguir levantar fundos para o tratamento. No fim, meu pai terminou a vida se tratando no Instituto do Câncer de São Paulo (ICESP), pelo SUS. Mas mesmo assim haviam muitas despesas e toda a ajuda financeira que os amigos dele conseguiram levantar foram indispensáveis para que ele morresse com dignidade.

Por tudo isso é que eu me sinto pessoalmente ofendida por essas declarações, que não só são hipócritas, uma vez que seus autores não utilizam nem utilizarão a saúde pública. É pelo desrespeito que não atinge apenas o líder político e seus familiares. Isso atinge a todos que já passaram pela dor de perder alguém amado para o câncer. Atinge à memória do meu pai e a mim.

Força, Lula! Que você vença essa doença desgraçada por todos nós.

sábado, 8 de outubro de 2011

Pesado demais para as redes sociais

- Eu voltei a ler Bukowski, depois de todos esses anos. Na semana passada comprei dois livros dele.
- E você voltou a beber vodca sozinha em casa enquanto escreve?
- Não, eu parei de escrever.

Obviamente eu estava mentindo. Sobre as duas coisas.

Depois disso eu disse que precisava comer alguma coisa e desliguei o computador. Mas era mentira de novo. Eu queria sair pra preparar uma espécie de Hi-Fi diet que inventei, substituindo o suco de laranja por suco de melão com adoçante. Ou como eu chamo, Hi-Fhoutz.

Sábado à noite. Nem meus gatos estão em casa. Só eu e minha rinite. Você não faz ideia do quanto é difícil fumar com apenas meia narina funcionando.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

ser adulto é...

...aceitar-se e saber que algumas coisas nunca vão mudar. Ou seja, não deu certo esse negócio de vida careta. E olha que eu tentei, inclusive deixei de sair durante a semana passada, porque era meio de semana e porque o meu homem não ia. Mas aí chegou o sábado e eu queria encontrar meus amigos e não ia ficar em casa porque meu homem tinha outro compromisso (e eu não sou mulherzinha pra viver grudada e dependente de homem). Aí saí pra tomar uma cervejinha inocente, acabei chapando e no dia seguinte ao tomar um brunch cheio de maldade com meus amigos sobreviventes eu me senti ótima.

Ou seja. Em uma semana eu comprovei que a vida careta não é pra mim mesmo.

domingo, 17 de abril de 2011

Vida gonzo

Começa na próxima segunda-feira, 24, o projeto para uma vida careta. Tem várias coisas que me levaram a essa ideia fixa. É uma forma de "retiro espiritual" dessa vida louca que eu tenho levado. Daqui a algum tempo eu pretendo ter um filho e pra isso preciso saber desapegar da boemia. E tem o fato de que eu sempre disse que enlouqueceria se tivesse que levar uma vida certinha e "normal". Hora de testar a hipótese.

(Eu brinquei com meu marido antropólogo que seria uma mistura de jornalismo gonzo e sociologia, uma sociologia gonzo. Aí ele me disse que a sociologia é o gonzo).

Mas o que seria uma vida careta? Vamos lá aos critérios da experiência.

1- Pessoas caretas não chapam
Eu nunca entendi o conceito de beber socialmente. Como diz o ditado, eu bebo pra ficar ruim, se fosse pra ficar bem eu tomaria remédio. Vamos ver como é isso. Eu já passei um tempo sem beber (promessa) e sempre ficava meio deslocada quando as pessoas começavam a entrar numa vibe que só o álcool proporciona. Por outro lado, tenho amigos muito legais que não bebem e se divertem muito. E o credo careta diz que as pessoas não precisam beber pra se divertir, não é? Vamos ver como é isso.

2- Pessoas caretas não saem durante a semana. Nem sem o seu par.
Deixar de sair durante a semana. Isso é fácil e difícil ao mesmo tempo. Fácil porque agora eu trabalho à noite quase todos os dias. Difícil porque a melhor balada que eu vou é justamente durante a semana (porque sair sexta e sábado, bom, é coisa de gente fraca, que tem que acordar cedo no dia seguinte).
O segundo ponto diz respeito a ter um compromisso. Casais caretas não saem separadamente. Ou saem, para os homens fazerem "programa de homem" (bar, jogar videogame ou futebol) e mulheres para fazer "programas de mulher" (shopping, almoçar com as amigas). Acho o próprio conceito de ter programa de homem ou de mulher extremamente babaca.
Mas epítome da babaquice da vida do casal careta, pra mim, é sair de casal. Afinal, que porra é essa? Vamos ver se eu descubro.

3- Pessoas caretas colocam o trabalho em primeiro lugar.
Apenas recentemente aprendi a ser responsável com trabalho. E curiosamente foi só depois disso que consegui um emprego com o qual eu realmente me importo. Mas decidi levar isso ao limite e só fazer qualquer coisa relativa ao lazer depois que tiver dado conta dos meus compromissos de trabalho. Dureza.

4- Pessoas caretas têm uma rotina
Aí vai ser complicado. Nunca tive muito método pra nada. Porque eu não acredito em método! Vou ter que esboçar um quadro de horários e me esforçar pra viver de acordo minimamente. Depois eu coloco ele aqui.

A experiência deve durar 40 dias. Enquanto isso as observações serão publicadas neste diário de campo e ao final do projeto, um relatório de conclusão. Isso constitui mais um desafio: levar meus projetos malucos até o fim.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Esforço derradeiro

Acho que eu tive blog durante muito tempo e perdi a paciência para escrever. Ou, a hipótese mais provável: a análise tirou de mim a necessidade de escrever e me deu um pouco mais de bom senso diante da exposição. De qualquer forma eu sinto falta de escrever. Não só de escrever, mas de ser lida, ainda que eu me dirija a um leitor imaginário que eu não sei quem é. Ou sei, já que a essa altura poucas pessoas ainda tem paciência pra me acompanhar. (Não é, Carlos?)

Enfim, decidi retomar, ainda que não saiba muito bem com que frequência vou atualizar. Estou com um novo projeto, acho que assim pode funcionar. De vez em quando eu tenho algumas ideias fixas. Algumas duram apenas algumas semanas, outras não me deixam sossegar enquanto não as coloco em prática. Esses dias me ocorreu que, apesar de sempre ter afirmado que levar uma vida certinha e careta me enlouqueceria. Mas esses tempos me ocorreu que eu nunca realmente tentei (apesar da minha vida hoje ser hoje a maior calmaria comparada ao que já foi).

Enfim, já pensei nisso o suficiente pra saber que é algo que eu quero fazer. Afinal de contas, eu quero ser mãe um dia, preciso aprender a me desapagar desse estilo de vida desclassificado e moralmente questionável. A minha primeira escolha de nome para esse blog era "Eu também sei ser careta". Então vamos levar isso adiante. Inicialmente o projeto durará 40 dias. É claro que eu vou meter o pé na jaca com força até o dia chegar, mas já marquei a data: 20 de abril. Isso mesmo, em pouco mais de uma semana.

Mais tarde eu falo um pouco mais sobre isso. Até.

Vou fazer

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

My boys

Os meus dois melhores amigos estão indo embora de São Paulo. Um é nordestino, o outro, do interior do estado. Ambos vão fazer o percurso inverso da maioria que chega a esta terra prometida brazuca: estão indo atrás de melhores oportunidades profissionais. Porque São Paulo é boa, mas cansa. Ou nesse caso, satura.

Quem fica pra traz como eu tem essa sensação de que está esperando a hora de apagar a luz, pois, como a maioria da população desta cidade, eu também vim de longe para realizar meus sonhos suburbanos na cidade grande. Só que eu não sabia que quem transforma esse lugar em seu ninho, muitas vezes pode não perceber o que São Paulo realmente é: um lugar de passagem.

E eu tive que me acostumar a dizer adeus.

Eu queria estar alegre por todos os que se foram. Eu queria ser uma pessoa madura e equilibrada, que fica feliz pelos outros e pensa que tudo será para o melhor deles, que sejam muito felizes. Mas eu não sou assim.

Eu só consigo pensar que estou perdendo meus amigos mais próximos de uma única tacada. Que eles vão se mudar para cidades vizinhas e continuarão se vendo, enquanto eu vou ficar aqui sozinha. Enquanto eu vou ter que ficar aqui e andar com meninas. Eu vou ficar aqui e aprender a sair de casal, andar com os amigos do marido.

E não é que eu não tenha outros amigos ótimos, não é que os amigos do meu marido também não sejam ótimos. Mas é que esses dois, assim como aquele curitibano que fugiu pra terra gelada, são os meus meninos. E mais uma vez eu vou ter que me acostumar a viver sem eles, com esse buraco no coração, já que pra essas coisas não há substituto e não há tempo que cure.